Sintra da Beira foi o cognome dado à simpática vila de Alpedrinha por D. Leonor de Almeida (1750-1839), a marquesa de Alorna, quando aqui esteve, quiçá em busca de recordações familiares: os seus antepassados – os marqueses de Castelo Novo – tinham ligações com a região. Esta sensível poetiza, grande admiradora da natureza à qual dedicou vários poemas, ao fazer tal comparação terá sido surpreendida beleza e pujança desta terra e do seu enquadramento natural.
Alpedrinha, Palácio do Picadeiro. |
Apesar do passado glorioso deste berço de gente afável e ilustre, assim como da sua deslumbrante serra, outrora um paraíso botânico e venatório, não tem merecido o respeito dos homens, pois, o progresso que lhe tem sido imposto abriu algumas feridas neste espaço de afectos que é urgente proteger.
Sendo uma das mais bonitas terras do concelho do Fundão, devido ao seu enquadramento natural e ao seu vasto património arquitectónico, isso não impediu que tenha ficado esquecida dos poderes públicos.
Alpedrinha é uma das mais importante referências cultural de todo o concelho e, apesar do relativo abandono em que se encontra, conserva ainda muitos vestígios do seu orgulhoso passado com os quais surpreende os visitantes que a procuram.
O seu encanto deve-se, em boa parte, ao carinho que muitos dos seus habitantes põem – quase sempre sem apoio das entidades oficiais – na conservação e preservação de muitas das características originais do seu parque histórico–imobiliário, evitando o seu aviltamento e destruição. Porém, este espírito de salvaguarda do património comum, não tem sido generalizado a toda a população. Muitos dos que admiram esta magnífica terra, vêm assistindo, com manifesto desagrado, a vários atentados que desvirtuam e adulteram o seu notável centro histórico com construções de desmedida volumetria e materiais incompatíveis com os tradicionalmente usados.
No seu magnifico conjunto urbano predomina um curioso diálogo entre habitações modestas de cariz popular, com mansões senhoriais de arquitectura erudita. É este conjunto que é preciso preservar e revitalizar, impedindo a todo o custo que, a breve prazo, fique à mercê dos interesses da especulação imobiliária, sem regras e sem limites, que tantos danos irremediáveis tem causado no nosso património edificado. Dizemos isto porque começa a ser visível o incremento de construções insólitas que desfiguram esta magnifica paisagem humanizada e recriada ao longo de muitos séculos.
Na última década fomos constatando, com grande mágoa, alguns processos de descaracterização do seu património rural e urbano, a partir de novas edificações e da reconstrução de alguns imóveis degradados, com a alteração das cérceas correntes por acrescentamento de pisos e varandas corridas a todo o comprimento da fachada, assim como a introdução de revestimentos de materiais e cores não tradicionais ou até de caixilharia de alumínio. Também é visível o sistemático aparecimento, no meio da sua malha urbana, de edifícios que pela sua volumetria e técnicas construtivas “esmagam” e desfiguram totalmente esta pequena vila, pondo em risco o seu desenvolvimento equilibrado, numa lenta acção de vandalização que é comum a todo o concelho do Fundão, ou melhor dizendo: comum a tudo o país que se rendeu ao deslumbramento pacóvio pelas torres de betão ...
Para contrariar estas tendências que cada vez mais põem em causa o património edificado desta simpática vila, é necessário a criação de normas e regulamentos municipais de suporte às intervenções, que enquadrem os projectos de alterações para esta área, ainda que com alguma flexibilidade, mas sempre supervisionados por técnicos competentes.
A reposição e beneficiação do parque habitacional de Alpedrinha é uma necessidade imperiosa, porém deve ser feita dentro de condicionalismos que obriguem ao respeito por todo o seu conjunto edificado.
A reconstrução e beneficiação das habitações do seu núcleo antigo mantendo as suas características tradicionais, é um objectivo desejável, o qual deve ser apoiado pelos poderes públicos, o que não tem acontecido... Porém, a destruição de alguns elementos do seu habitat tradicional para sobre ele edificar grandes “gaiolas” em betão armado que desfiguram o ambiente e são um atentado contra o património, tem sido uma constante e deve motivar a condenação social dos seus autores.
Compete aos seus habitantes oporem-se às “modernas” construções que vão aparecendo e começam a ameaçar o centro histórico da vila. A Liga dos Amigos de Alpedrinha, deveria ter como um dos seus objectivos a formação de uma corrente de opinião que se oponha aos atentados contra este valioso conjunto patrimonial.
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Algumas das exigências fundamentais, para a preservação do núcleo antigo de Alpedrinha, passarão pelo respeito por certas normas elementares, tais como: demolições controladas e só admitidas em condições excepcionais; observância da escala do núcleo antigo, de modo a manter a homogeneidade e consistência do conjunto; nas obras de renovação e beneficiação, observar a manutenção, sempre que possível, dos materiais originais (pedra, madeira, telha, gradeamentos e ferragens de ferro forjado); nas obras de beneficiação dos edifícios, manter os pormenores construtivos e as cores tradicionais, respeitando o equilíbrio cromático da área em que se inserem. Quanto ás obras de natureza comercial, estas devem tomar em conta o carácter e a expressão arquitectónica dos edifícios em que venham a integrar-se, com especial atenção em relação à introdução de montras e inserção de publicidade de modo a não afectar a correcta leitura das fachadas.
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O cidadão comum está farto de promessas e de projectos não concretizados para remediar o caos urbanístico em que se está a tornar o concelho do Fundão, ao qual Alpedrinha não escapa, correndo o risco de vir a soçobrar face ás noções de modernidade dos edis que sobre ela exercem o poder.